[MÚSICA] O FINO RAP ORQUESTRADO DE SHAWLIN

A trajetória do MC Shaw passa por um momento produtivo do hip-hop carioca, vivido como integrante do coletivo Quinto Andar, muda de rumo empurrada pela necessidade de ganhar o pão em um estúdio e deságua em seu apartamento, em São Paulo, onde restaura gravações antigas de música orquestral russa e constrói beats e rimas como os que saem do forno em seu segundo disco solo, "Orquestra Simbólica".

Trata-se de uma bem-vinda adição à estante de hip-hop autoral, que discute tanto cidadania e corrupção quanto questões de identidade pessoal (lá por meados do disco, surge o Shaw diabólico em conflito com o santo), e tem também um punhado de beats inteligentes, como O Mago, que apontam o rap nacional para direções mais abstratas, calcadas em experimentações sonoras em vez de enfadonhos samples de soul music (curiosamente usados extensivamente por Shaw no disco, mas de maneiras menos óbvias das que costumamos ouvir).

"Uma vez, minha mulher me mostrou um discurso do presidente da Coca-Cola que tinha muito a ver com o que eu estava fazendo. O cara falava da necessidade e dificuldade de equilibrarmos nossa vida profissional, amorosa, saúde, e comparava isto a uma orquestra, em que todos os instrumentos têm de funcionar em sincronia. A partir daí, busquei trabalhar sobre o tema de uma 'Orquestra Simbólica', em que um personagem principal tenta se equilibrar entre esses aspectos de sua vida."

Vindo de um rapper conhecido desde a adolescência como Shawlin (além de ter os olhos meio fechados, por natureza, o THC colaborava para o look oriental), e que se deixasse crescer um fu manchu não estaria longe de parecer-se com um jovem mestre de kung fu, isso pode soar como conselho zen. Mas no disco toma a forma de múltiplos diálogos internos, intermediados por samples dublados de Matrix e Frankenstein, que estão longe de serem resolvidos.

Há no entanto, um paralelo palpável entre esse "equilíbrio" suado e a arte de Conrado Costa Silva Vieira, carioca de 28 anos. Depois de seus dias no cultuado coletivo Quinto Andar, escola da nata do rap carioca, origem do grupo Subsolo, de Kamau, Lumbriga, Gato Congelado e outros, Shaw ainda lançou seu primeiro disco solo, "Ruas Vazias", de 2007, que tem a ótima Neblina. Enveredou, então, para o estúdio para garantir o sustento. Trabalhou como assistente de gravação e subiu pela hierarquia de técnicos de áudio até virar restaurador profissional, limpando chiados de gravações orquestrais da rádio nacional feitas antes do fim da União Soviética.

Hoje, Shaw passa seus dias a serviço do selo holandês Brilhant Classics, dando um talento em Tchaikovsky, Prokofiev, Shostakovich e outros. Naturalmente, essa imersão diária em música erudita começou a pipocar em seu trabalho de produtor. Além de beats, todas as vinhetas de "Orquestra Simbólica" são sampleadas dos mestres russos, o que, misturados a outros cortes de soul e música de filme dá uma dimensão límpida às suas produções.

Como destaques desse diálogo entre salas de orquestras e black music estão "A Fé - Reza Forte", que Shaw fez com Black Alien, e "Algo Lindo", que tem participação de Luiz Melodia em meio a recortes de bossa. Os samples são processados de maneira irreconhecível. Um "ah" de Dorival aqui, um órgão de soul recortado ali, um sintetizador de Vangelis acolá: misturas polivalentes em meio ao cânone russo.

por: Roberto Nascimento - O Estado de S. Paulo

Shaw - Orquestra Simbólica (2012)

01. Intro - Mov. I - Apresentação (01:01)
02. Intro - Mov. II - A Orquestra Começa - O Mago (Prod. Shaw) (03:42)
03. Intro - Mov. III - Nasce o Vilão - Criando Monstros part. DJ Mako (Prod. Shaw) (03:04)
04. Cotiano I (O Início) - A Área (Prod. Papatinho) (04:32)
05. Réquiem para Mocidade (A Caixa) - Homem é Crescer part. Juju Gomes (Prod. Shaw) (03:32)
06. Cotidiano II (O Meio) - Coração (Prod. Shaw) (03:34)
07. Sonhos de Futuro - Na Saga (Prod. Dario) (02:53)
08. Sonhos de Grandeza - Aliança Pt. 3 (Prod. Damien Seth) (03:38)
09. Estudos para Pessimismo e Piano - O Teatro dos Corruptos (Prod. Shaw) (03:21)
10. O Maestro - Orquestra Simbólica (Prod. Shaw) (03:18)
11. A Fé - Reza Forte part. Black Alien (Prod. Shaw) (03:40)
12. Noturno - Cidade das Luzes (Prod. Shaw) (04:02)
13. Sonhos de Justiça - A Revolta part. Renato Biguli (Prod. Shaw) (05:59)
14. Op. 171 - Malditos Políticos (Prod. DJ Caique) (04:20)
15. Prelúdio para Ego e Determinação (O Vilão Diz) - Passos Firmes (Prod. Shaw) (04:54)
16. Pausa para Luxúria (Prod. Cabes) (04:07)
17. Hedonismo e Fuga - Viver, Zoar, Amor part. Juju Gomes (Prod. Shaw) (04:09)
18. O Etéreo - Sob Controle (Prod. Shaw) (03:57)
19. Cotidiano III - (O Fim) - As Verdades Pt.2 part. Juju Gomes (Prod. Vina) (04:40)
20. Finale - Algo Lindo part. Luiz Melodia (Prod. Shaw) (Faixa Especial) (05:01)

CONDUZA!

No encarte do álbum Shaw lança questionamentos universais e faz reflexões que só mostra mais como o rapper possui "visão" e consciência, vejam algumas:

1 - O que foi o Big Bang?

2- Como é o fim?

5 - Contemplem o infinito. Assim nasce, morre e renasce o universo.

10 - A vitória da destruição, traz sua própria ruína, não restando escolha senão a criação.

11 - Deus vive de fora pra dentro, não há fora dele!

12 - A vida humana é a metodologia pela qual uma partícula da consciência de Deus ( o homem) que nada sabe, pode obter o conhecimento por mérito próprio se elevando de volta a Deus.

13 - A experiência em si também é uma dádiva. A vida é para os seres vivos, entre elas o homem!

14 - Toda forma de vida é uma cristalização da consciência divina.

16 - De acordo com nossas escolhas sintonizamos nossa consciência em diferentes realidades através do resultado da interação de duas forças: ação e reação. Sendo nesse caso a visão que você tem do mundo versus a visão que o mundo tem de você.

17 - Tentar convencer o mundo - sendo todos nós partes diferentes de uma única consciência - é o mesmo que tentar convencer uma parte de si mesmo.

18 - Lembre-se! Todos são protagonistas. Todos são coadjuvantes.

19 - Transcender é um objeto pessoal, não coletivo. Devemos inspirar o coletivo a promover a iluminação pessoal.

20 - Esse deslocamento entre:

A - As realidades através das escolhas, levando em consideração a realidade dos outros perante a sua própria.

B - Das escolhas ante as adversidades em busca do conhecimento para transcender (iluminação) - em que o meio muda o homem e o homem muda o meio - Que me refiro por "Orquestra Simbólica"
 

   

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